intervenção realizada no memorial da américa latina (ago-dez/2018)
desenvolvida com estela roca, hiram latorre, julia lara e thiago simbol
A escalafobia da Barra Funda é bastante notável. Galpões, muros e portões foram construídos sem se considerar a escala do homem. Na Barra Funda, adotou-se a escala do carro.
Com isso em mente, resolvemos construir um corpo cabível a sua escala. Quisemos elevar o homem à Barra Funda, tornando possível ocupá-la a pé. Durante 6 meses , realizamos experimentos para possibilitar a construção desse corpo. Concluímos que, para ocupar a Barra Funda, precisaríamos de altura e, para altura, nada melhor gás hélio. O corpo deveria ser um balão.
experimento 01: barra funda
Andar pela Barra Funda é sentir-se constantemente minúsculo. Nosso primeiro experimento se baseou em representarmos, por meio de fotografias, essa sensação escalafobética. A sensação de na Barra Funda tudo ser monumental, menos as pessoas. 
Foi assim que surgiu o desejo de construir um corpo essencialmente humano capaz de ocupar aquele espaço, nos monumentalizando a sua escala. 
fotografia: thiago simbol
experimento 02: hélio
material: galão de hélio, balões de festa, tule e nylon
O segundo experimento iniciou a sequência de tentativas para a construção desse novo corpo. Era necessário que ele fosse alto, só assim ele poderia refletir nossas ações em alturas que nossos próprios corpos não alcançam. Para isso, nada melhor que trabalharmos com balões de hélio.
Foi o nosso primeiro contato com os materiais. Enchemos diferentes tipos de balões de festa com hélio e observamos suas reações. Qual seria o peso que eles poderiam suportar? A qual altura chegariam? Quais seriam suas formas? 
No entanto, balões de festa são, obviamente, festivos demais. Na rua, parecíamos estar participando de uma espécie de comemoração flutuante , que, por flutuar muito alto, quase se emaranhou também à fiação elétrica. O corpo humano precisaria ter maior controle sobre o novo corpo que, por sua vez, deveria ser bem mais neutro. A conclusão do Experimento 02 foi uma mistura esdrúxula entre um bolo de noiva e uma pipa.
experimento 03: unidade e módulo
material: ferro de passar, embalagens de presente cromadas formato A4, silver tape preta e nylon
Todo e qualquer balão comercializável está associado a festas. Logo, se queríamos um balão mais neutro, teríamos que confeccioná-lo nós mesmos. Foi assim que nos decidimos a criar nossa própria unidade. 
Tínhamos a opção de trabalhar com dois tipos de material: ele deveria ser elástico (látex de balões convencionais), ou muito leve (sacolas plásticas de mercado). Testamos embalagens de presente cromadas. Funcionou perfeitamente bem. Além de leves, as embalagens já são pacotes (têm 3 lados já fechados) e seu prateado as aproximava de um espelho. Ou seja, elas poderiam refletir por si só todo o vazio da Barra Funda.
Devido suas características (pequenos retângulos prateados e flutuantes), poderíamos montar com elas um enorme tapete. Nosso novo corpo se constituiria, então, de uma série de embalagens retangulares organizadas em fileiras e colunas, formando um retângulo maior. 
1. fechar abertura com ferro de passar
1. fechar abertura com ferro de passar
2. fazer um pequeno corte em uma das pontas
2. fazer um pequeno corte em uma das pontas
3. encher com hélio
3. encher com hélio
4. fechar a abertura com silver tape
4. fechar a abertura com silver tape
5. montagem do módulo
5. montagem do módulo
experimento 04: flutuante I
material: ferro de passar, embalagens de presente cromadas formato A4, silver tape preta e nylon
Em um ambiente fechado, montamos um retângulo de 4 unidades x 4 unidades (cerca de 0,9x1,2m). Depois de pronto, levamos o corpo a pé até o terraço do IAB, até então vazio. Para andar com os balões na rua, cada integrante do grupo controlou uma ponta (com os fios estavam completamente enrolados nos pulsos). Chegando no terraço, laceamos o fio cada vez mais, deixando que o corpo voasse cada vez mais alto. 
experimento 05: flutuante II
O segundo flutuante serviu como cobertura provisória de um jardim. Agrupamos 72 embalagens (tamanho A4) em 9 colunas e 8 fileiras, construindo um corpo de aproximadamente 2,0x2,5m.
Sua própria estrutura ajudou na construção. No entanto, levamos muito tempo para concluir o flutuante II. O corpo que levaríamos à Barra Funda seria ainda maior que aquele, deveríamos usar unidades também maiores.

experimento 06: flutuante III
No terceiro flutuante, testamos dois importantes pontos: o uso de unidades maiores (tamanho A0) e a construção do flutuante na própria Barra Funda, para não precisarmos transportá-lo depois. O lugar mais cômodo para a montagem era, sem dúvida, o Memorial da América Latina.
Ele ficou bastante murcho (além do hélio ter acabado muito antes do esperado, o piso do memorial é bastante arenoso e acabou fazendo pequenos furinhos nas unidades). No experimento final, seria melhor voltarmos às embalagens menores e levar para a Barra Funda o flutuante já pronto.

experimento 07: flutuante IV
Para o último flutuante, usamos 126 embalagens cromadas A2 agrupadas em 9 colunas e 14 fileiras (cerca de 4,0x8,5m). Procurando economizar material, intercalamos hélio e oxigênio (para cada 4 unidades, uma foi preenchida com oxigênio, ao invés de hélio).
Nos encontramos na República, montamos o flutuante e saímos a pé em direção ao Memorial da América Latina. Era sábado, podíamos ir andando pelo Minhocão. Foi incrível. Durante todo o percurso, tentamos controlar o flutuante o máximo possível. Ele ainda não podia se abrir totalmente. Mesmo assim, muitas pessoas paravam para perguntar o que estávamos fazendo, aonde estávamos indo com aquele balão. Tiravam fotos, vídeos, perguntavam nosso nome, nos mostravam para as crianças.
Chegando no Memorial, deixamos que o flutuante flutuasse. E ele efetivamente flutuou. De repente, o que na República parecia enorme, nos pareceu pequeno. O flutuante passou o caminho inteiro compactado, porque não cabia em nenhum outro lugar que não o Memorial da América Latina. É escalafobético demais. 
Se parado ele já chamava atenção, flutuando o flutuante era fascinante. Muitas outras pessoas entraram no memorial só para vê-lo, chegando até a manuseá-lo. É realmente estranha a sensação de uma arquitetura verdadeiramente plástica, no sentido mais puro da palavra. A arquitetura que realmente se molda, se adapta em tempo real. Quando assim, ela nos desperta uma encantadora curiosidade, justamente por se distanciar de seus próprios dogmas. Desafia a ideia de permanência, concretude: se trata de uma arquitetura feita de ar, tão leve quanto ele. É realmente a utopia de nosso próprio gesto, nosso próprio corpo, nos refletindo a uma escala que jamais alcançaríamos.
fotografia: joão latorre e thiago simbol
ilustrações
técnicas mistas sob canson A4 120 g/m
desenhos feitos durante todo o processo de construção do flutuante, depois de cada experimento
hélio
hélio
unidade/módulo
unidade/módulo
flutuante I
flutuante I
flutuante II
flutuante II
flutuante III
flutuante III
flutuante IV
flutuante IV

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